Artigo - A Nova Ordem Multilateral e a Agressão ao Brasil: O BRICS no "Canal da História"

17ª Cúpula Anual do BRICS, realizada no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7 de julho de 2025, foi mais do que um encontro diplomático. Foi um marco histórico que solidificou a coerência programática de uma nova geopolítica. As deliberações ali tomadas, focadas em multilateralidade, cooperação sem subordinação e autonomia nacional, desenham o contorno de uma nova ordem social em ascensão, desafiando a hegemonia de um sistema unipolar em declínio.

No entanto, como um parto difícil, essa transição não ocorre sem dor. A reação agressiva dos Estados Unidos, liderados por uma administração de ultradireita, contra o Brasil serve como um sintoma claro das contradições e das resistências que acompanham a emergência do novo. A investida não é apenas contra o Brasil, mas contra os próprios pilares que o BRICS representa, ecoando a ontogenia de impérios em decadência que lutam para manter o controle, tal como analisado por pensadores como Edgar Morin, ao discutir a complexidade das crises e a necessidade de uma “reforma do pensamento”.

A ofensiva contra o Brasil se manifesta em três frentes principais, revelando a lógica reacionária de um império decadente:

  • Ataque ao sistema jurídico autônomo: A interferência em um sistema judiciário soberano demonstra a tentativa de minar a autonomia das nações. Ao violar o princípio de que um país deve gerir suas próprias leis, a agressão busca desestabilizar as instituições republicanas e enfraquecer a coesão interna.
  • Apoio a lideranças autoritárias: O apoio a grupos neofascistas e autoritários reflete o desejo de manter um perfil ideológico que sustente o status quo obsoleto. Essa tática busca criar divisões e implantar lideranças alinhadas aos interesses hegemônicos, impedindo o avanço de governos que promovam soberania e justiça social.
  • Política de taxação universal (“America First”): A estratégia de impor taxações unilaterais e irrestritas, sob o lema “Make America Great Again” (MAGA), é uma tentativa de remodelar o comércio global a seu favor, desrespeitando acordos e mecanismos multilaterais. Essa abordagem ignora a interdependência econômica e promove uma visão de mundo em que o interesse de uma nação se sobrepõe ao de todas as outras.

Apesar da dor e da resistência, a força do novo se manifesta na coerência histórica dessas incongruências. A agressão dos EUA, em vez de isolar o Brasil, parece ter o efeito oposto. A “avalanche de países” que se aproximam do BRICS é a resposta lógica a essa investida, pois a consciência histórica dos povos reconhece que a multilateralidade é a única via para a estabilidade e a paz. A cooperação sem subordinação, a autonomia das nações e a justiça global ressoam em um momento de crise.

Nesse contexto, o BRICS, como um nascituro, avança pelo “canal da história”. Suas dores e gemidos são os sons de uma transição inevitável.

Como afirmaria Humberto Maturana, a ontogenia do novo emerge da interação e da acoplagem estrutural que o sistema em si produz, e a coerência entre seus membros (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) gera a força necessária para o parto. O BRICS não é apenas uma aliança econômica, mas o símbolo de uma era pós-moderna: a “Era do Humanismo Sistêmico”, que busca um mundo mais justo e humano, em que a vida e a dignidade sejam os vetores resultantes de toda ação política.

A persistência dessa nova ordem, apesar dos ataques, sugere que as bases de um sistema mais justo e humano estão sendo lançadas.

Diante de tais desafios, como a comunidade global pode fortalecer e proteger esses nascentes princípios de multilateralidade e cooperação?


Diógenes Sandim Martins
é médico, diretor do Sindnapi e secretário-geral do CMI/SP

 

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